segunda-feira, 10 de junho de 2013

Texto: Pausa (sequêcia didática)

                                                                     


LEIA O CONTO DE MOACYR SCLIAR

PAUSA

Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro. Fez a barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:
—Vais sair de novo, Samuel?
Fez que sim com a cabeça. Embora jovem, tinha a fronte calva; mas as sobrancelhas eram espessas, a barba, embora recém-feita, deixava ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.
—Todos os domingos tu sais cedo – observou a mulher com azedume na voz.
—Temos muito trabalho no escritório – disse o marido, secamente.
Ela olhou os sanduíches:
—Por que não vens almoçar?
—Já te disse: muito trabalho. Não há tempo. Levo um lanche.
A mulher coçava a axila esquerda. Antes que voltasse a carga, Samuel pegou o chapéu:
—Volto de noite.
As ruas ainda estavam úmidas de cerração. Samuel tirou o carro da garagem. Guiava vagarosamente, ao longo do cais, olhando os guindastes, as barcaças atracadas.
Estacionou o carro numa travessa quieta. Com o pacote de sanduíches debaixo do braço, caminhou apressadamente duas quadras. Deteve-se ao chegar a um hotel pequeno e sujo. Olhou para os lados e entrou furtivamente. Bateu com as chaves do carro no balcão, acordando um homenzinho que dormia sentado numa poltrona rasgada. Era o gerente. Esfregando os olhos, pôs-se de pé:
—Ah! Seu Isidoro! Chegou mais cedo hoje. Friozinho bom este, não é? A gente...
—Estou com pressa, seu Raul – atalhou Samuel.
— Está bem, não vou atrapalhar. O de sempre - Estendeu a chave.
Samuel subiu quatro lanços de uma escada vacilante. Ao chegar ao último andar, duas mulheres gordas, de chambre floreado, olharam-no com curiosidade:
—Aqui, meu bem! – uma gritou, e riu: um cacarejo curto.
Ofegante, Samuel entrou no quarto e fechou a porta a chave. Era um aposento pequeno: uma cama de casal, um guarda-roupa de pinho: a um canto, uma bacia cheia d’água, sobre um tripé. Samuel correu as cortinas esfarrapadas, tirou do bolso um despertador de viagem, deu corda e colocou-o na mesinha de cabeceira.
Puxou a colcha e examinou os lençóis com o cenho franzido; com um suspiro, tirou o casaco e os sapatos, afrouxou a gravata. Sentado na cama, comeu vorazmente quatro sanduíches. Limpou os dedos no papel de embrulho, deitou-se fechou os olhos.
Dormir.
Em pouco, dormia. Lá embaixo, a cidade começava a move-se: os automóveis buzinando, os jornaleiros gritando, os sons longínquos.
Um raio de sol filtrou-se pela cortina, estampou um círculo luminoso no chão carcomido.
Samuel dormia; sonhava. Nu, corria por uma planície imensa, perseguido por um índio montado o cavalo. No quarto abafado ressoava o galope. No planalto da testa, nas colinas do ventre, no vale entre as pernas, corriam. Samuel mexia-se e resmungava. Às duas e meia da tarde sentiu uma dor lancinante nas costas. Sentou-se na cama, os olhos esbugalhados: o índio acabava de trespassá-lo com a lança. Esvaindo-se em sangue, molhando de suor, Samuel tombou lentamente; ouviu o apito soturno de um vapor. Depois, silêncio.

Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para a bacia, levou-se. Vestiu-se rapidamente e saiu.
Sentado numa poltrona, o gerente lia uma revista.
— Já vai, seu Isidoro?
—Já – disse Samuel, entregando a chave. Pagou, conferiu o troco em silêncio.
—Até domingo que vem, seu Isidoro – disse o gerente.
—Não sei se virei – respondeu Samuel, olhando pela porta; a noite caia.
—O senhor diz isto, mas volta sempre – observou o homem, rindo.
Samuel saiu.
Ao longo dos cais, guiava lentamente. Parou um instante, ficou olhando os guindastes recortados contra o céu avermelhado. Depois, seguiu. Para casa.

(in: Alfredo Bosi, org. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo: Cultrix, 1977. p. 275)

Sequência Didática
Tempo de duração: 2 aulas

Texto: Pausa (Moacir Sclyar)

Tempo de duração: 2 aulas

Público alvo: Fundamental II (nono ano)
Objetivo: Estímulo à criatividade e a produção escrita;

               Inferir sentidos implícitos no texto;

               Relacionar as informações do texto com outras áreas de conhecimento

Habilidades: Criar expectativas em relação ao título;
                     Formular hipóteses a respeito das sequências do enredo;
                     Antecipar o tema ou a ideia principal a partir de elementos paratextuais, como título, subtítulo, do exame de imagens, de saliências gráficas etc.;
                          Levantar o conhecimento prévio sobre o assunto;
                    Esclarecer palavras desconhecidas a partir de inferência ou consulta a dicionário;
                         Formular hipóteses a respeito da sequência do enredo;
                         Relacionar informações para tirar conclusões;
                         Avaliar o texto criticamente;
                        Identificar palavras-chave;
                        Identificar as pistas do autor;

Competências: leitura e escrita

Material utilizado: o texto fragmentado para os grupos

Produção: Leitura compartilhada – o que eles produziram;

Leitura do texto na íntegra pelo professor comparando-o com o que os alunos produziram na sala de aula.

Finaliza-se com uma indagação: O título está de acordo com o texto?

Dê outra sugestão para o título.

11 comentários:

  1. Olá .Esse texto é muito bom, porém não ficou em evidencia no fórum de leitura quando da formação.Mas é muito bom.
    Avestruz foi o primeiro a lermos..........

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    1. Pedro, se você puder ajudar-me a melhorar essa sequência didática para nós postarmos, eu agradeço ou então podemos trocar de texto. A professora Rubiane disse que estava com o PC dela quebrado. Eu enviei um convite para ela ser também colaboradora do nosso blog. O que vocês decidirem, estará ok para mim. Mande para o meu email a sua sequência didática para que eu possa postá-la também no blog. O meu tempo está apertado, mas vou fazer o que puder.

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  2. Letramento e capacidades de leitura para a cidadania
    Roxane Rojo
    LAEL/PUC-SP
    “Ler é melhor que estudar”
    1
    . Esta frase de Ziraldo, já famosa, viroubotton e foi
    carregada do lado esquerdo do peito por parte de nossa juventude. Ela nos remete à
    ineficiência da escola e a sua distância em relação às práticas sociais significativas. Um
    depoimento de Miúcha, irmã mais velha de Chico Buarque de Hollanda e filha de Sérgio
    Buarque de Hollanda, historiador de Raízes do Brasil, pode nos esclarecer a razão da
    unanimidade desta parcela da juventude sobre como se aprende a ler fora da escola:
    “Sua [de Sérgio] influência sobre Chico e os outros filhos se dava de forma
    sutil. As paredes da casa da família eram cobertas por livros, e o pai
    incentivava a leitura através de desafios. ‘Ele não ficava falando para a
    gente ler’, conta Miúcha. ‘Mas era um apaixonado por Dostoiévski,
    conversava muito sobre ele. Nós todos líamos. E tinha Proust, aquela edição
    de 17 volumes. Ele dizia, desafiando e instigando: ‘Proust é muito
    interessante, vocês não vão conseguir ler, é muito grande. Ah, mas se vocês
    soubessem como era madame Vedurin...’ Aí todo mundo pegava para ler.”
    (Regina Zappa, Chico Buarque, pp. 93-94)
    “Ler é melhor que estudar”. Esta é uma opinião quase unânime e compartilhada
    pela população letrada e pertencente às elites intelectuais brasileiras: intelectuais,
    professores do ensino fundamental, médio e universitário, jornalistas, comunicadores da
    mídia. No entanto, a maior parcela de nossa população, embora hoje possa estudar, não
    chega a ler. A escolarização, no caso da sociedade brasileira, não leva à formação de
    leitores e produtores de textos proficientes e eficazes e, às vezes, chega mesmo a
    impedi-la. Ler continua sendo coisa das elites, no início de um novo milênio.
    Isso, se dá, em boa parte, porque as práticas didáticas d

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    1. Você me fez lembrar de um fime "O nome da Rosa". Nesse filme, a leitura era apenas para os padres. O povo não tinha acesso à leitura. Infelizmente no nosso país este privilégio é de poucos porque os livros são às vezes artigo de luxo. Pagamos muito caro pelo conhecimento. Eu prefiro ter um livro nas mãos para ler do que lê-lo na internet.

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    2. Roseli por gentileza me inclua na primeira página do nosso Blog como colaborador, voce conseguiria?
      Estive olhando o blog e meu nome não aparece na página inicial, por gentileza providencie , isso?
      abraços Obrigado

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    3. Pedro, você precisa aceitar o meu convite que eu te enviei. A Raquel e a Rubiane conseguiram porque elas aceitaram o convite que eu enviei para elas. Pergunte para a rubiane ou a raquel como elas fizeram para aparecer o nome delas na página inicial. Se você aceitar o convite, o seu nome aparecerá como colaborador do blog também.

      Abraços e espero que você consiga. Eu vou deixar o convite em aberto para você tentar.

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  3. Nas palavras acima do Chico e da Miucha,nem é preciso o quanto é necessários transmitirmos nossa capacidade leitora aos alunos..
    Não que a escola é desnecessárias mas que saibamos usá-la como espaço de estímulo aos alunos

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  4. Meu Primeiro Beijo Clarice Lispector
    Debatido amplamente na escola de formação ganhou pique e seu apogeu foi fortementge influenciado nas dinãmicas de aulas dos nos dias posteiores às aulas.
    Pusa em prática principalmente este este no uso de um trabalho metalinguístico.
    A interdisciplinaridade foi divulgada e trabalhada, mas o que mais me chamou a atenção nessa tipologia textual foi a forma interacional e Baktiniana num processo de abordagem.de leitura e escrita.
    Se para Joaquim Dolz os gêneros são modelos e sugestões semióticos, porque não podemos também partir desse mesmo presuposto ao contemplarmos um texto da grandeza dentro da crítica literária .Meu primeiro beijo

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  5. Pausa , Moacyr Scliar
    Nesse belo conto, parabéns para o pessoal que trabalhou e sobre usar esse magistral trabalho já em sala de aula.Tenho esta proposta para o segundo semestre em usar com minhas crianças dos 9 anos.
    Eu teria que fazer uma abordagem muito séria para com meus estudantes e para o segundo bimestre as coisas prometem pois esse curso de formação está terminando e eu terei mais tempo para ela bora e fazer um plano de aulas usando todo esse material que nos foi disponibilizados.
    Duração e proposta de um trabalho de Metalinguagem em PAUSA -MOACY SCLIAR;
    De duas a três aulas
    Leitura em Voz alta todos compartilham a leitura.Leitura em Voz silenciosa, todos participam mas com muita atenção e silêncio em sala de aula.Naquele momento a sala de aula é uma verdadeira Biblioteca.
    Oralidade. Roda de leitura. Natrrativa, dramatização.
    Aplicar a proposta curricular do Estado de São Paulo, neste quesito: Competências e habilidades
    Início de uma narrativa onde destacaríamos: Os Elementos da Narrativa;Enredo( Como ? )personagem,tempo espaço, são elementos a serem exaltado e debatidos com os alunos.
    Como o texto apresenta elemento da narrativa (psicológico) vamos aos poucos e incutindo nos alunos um trabalho mais amplo no qual os alunos possam se deliciar ,com essa belíssima narrativa.
    Uma proposta de redação eu deixaria em aberto desde que o per
    sonagem Samuel todos domingos de manhã sumia.Cria-se uma sensação de istério...
    Onde o Samuel iria, o que ele fazia.Uma proposta de redação seria bem vinda visto que nada impede de que os alunos deem continuidade ao texto.



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  6. Nossa o nome da Rosa.Li esse livro uma primasia um gênio.O nome da Rosa fez muito sucesso na década de 80..O livro surgiu muuito antes e constava no NY Times como best seller.Você tem de fato um gosto refinado

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  7. Ler e Compreender eis a questão !!!

    Lá no curso de formação pouca coisa foi alterada quando meu grupo se empenhou com a temática exposta acima>naquele momento a situação de aprendizagem se definiu como:
    Que o mundo necessita de pessoas criativas e flexíveis ;mais do que especialistas superinformados não nos esquecendo para isso precisamos ler e compreender as questões não se importando com as suas culturas,credo,raça poderes e classes sociais diferentes para que todos possam se desenvolver socialmente.
    A questão do letramento ainda é uma situação mal resolvida analfabetos funcionais enfretamos no nosso dia a dia.
    Os vários níveis de leitura ainda.Seja uma leitura técnica,de auto ajuda,informativa,passa tempo,todas tem seus valores contextualizados.
    A leitura constitui-se num poderoso instrumento que quando levado à ênfase e efeito é estímulo para o aluno aproveitando sempre o conhecimento que ele já possui,já adquirido por ele.Que a configuração e modelo atual de leitor mudou muito;com a Globalização..Traduzindo-se assim não apenas o leitor que lê mas que dialoga com o texto e com o autor.
    Desta maneira amplia-se gradativamente as potencialidades do leitor,enriquecendo suas própias ideias e os incentivando para que a prática de leitura se torne um instrumento de libertação e de aprimoramento humano.

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